Se eu te
deixar falar vais dizer o que quero ouvir?
Se eu te der
um sítio vais sossegar?
Se eu te der
um livro vais fazer-lhe orelhas nas pontas?
Se eu gostar
de ti vais gostar de mim?
Respeitar-me?
Aceitar-me?
Perceber-me?
Eu sou
especialista em deixar falar, especialista em deixá-los dizer ao que vêm, o que
são, o que querem.
Gostava
tanto que me levasses a sério.
Porque é que
as pessoas não me levam a sério?
Eu gostava
de ser séria.
Quando falo
brincam comigo e eu não gosto.
Não gosto.
Quero respeitinho.
Silêncio!
Ouviram?
Silêncio que estou a falar!!!
Porra… isto
agora não correu bem.
Isto do
respeitinho não é nada respeitoso.
Ficou o
sítio que fiz limpo como o detergente.
Neste
silêncio quando falam dizem o que achava que queria ouvir mas… afinal não
quero… antes queria outra coisa.
O livro está
intacto como a ignorância que nunca mexe no que está quieto.
Respeitas-me?
Aceitas-me?
Percebes-me?
Não sei.
Estás assustado.
Tenho
saudades tuas a gozar da minha cara e do resto do meu corpo.
Sinto a
falta do barulho de quem anda à deriva nos intervalos da procura.
Às vezes o
amor disfarça-se de confusão e parece que não funciona mas… funcionava.
Porra! Funcionava!
Funcionava tão bem!
Todos se
riam de mim… mas riam-se.
Todos
gozavam comigo… mas gozavam.
Todos
discutiam comigo… mas tinham coragem.
Agora
sérios, agora sem prazer, agora bem comportados nem os sei.
Onde estão?
Estou
sozinha como os ditadores e não gosto de ser ditador é muito solitário por
isso…
Por isso…
Volto agora
a ser o louco da aldeia, a senhora que leva revistas para o farrapeiro, o bombo
da festa e os confetes pelo ar das bolinhas de cuspe festejam o meu regresso
como quem viajou pelo Mundo em busca de aventuras para perceber que estava
muito bem no seu reino.
É este o meu
reino. O povo é rebelde, a plebe só faz asneiras e os aldeões invadem-me o
palácio todos os dias, mas eu… mas eu… mas eu não quero saber e abro-lhes as
portas porque tenho espaço.
Há espaço
para todos.
Vá lá! Façam
barulho!
Vá lá! Façam
barulho!
Tinha tantas
saudades.
Texto de "O Manual da Felicidade" de João Negreiros
Muito bom, caro João!!!
ResponderEliminarAbraços
Jorge Vicente